Fonte: Dicionário Bibliográfico da Literatura Italiana Traduzida no Brasil

ELEGIA,

QUE O MAIS INGENUO, E VERDADEIRO SENTIMENTO CONSAGRA à DEPLORAVEL MORTE

DO ILLUSTRISSIMO, E EXCELLENTISSIMO SENHOR
+D. JOZÉ THOMAZ DE MENEZES+,
 
 
 

* * * * *

SEU AUTHOR
+M. M. B. B.+
 
 

LISBOA

Na Offic. de LINO DA SILVA GODINHO.

ANNO M. DCC. XC.
 

Com licença da Real Meza da Commissão Geral sobre o Exame, e Censura dos livros.

Hórridas sombras, hórridos vapores,

Que enlutais estes ares carregados

Por onde vão fugindo os meus clamores;

Sinistras Aves, que funestos brados

Espalhais de Ciprestes lutuosos,

Pela negra Tristeza bafejados;

A vós consagro os prantos dolorosos,

Que meus olhos derramam contra a dura,

Antiga lei dos Fados poderosos;

Antiga lei, que à feia sepultura

Arroja sem respeito, e sem piedade

A Virtude, a Grandeza, a Formosura!

Áspera lei, que a pobre Humanidade

N'um momento, n'um átomo arremessa

Ao centro da medonha Eternidade!

Tremendíssima lei, que tão depressa

Troca em ais, e desgostos a alegria;

Troca a Purpura em luto, o sólio em Eça.

Ah! Nunca amanhecera o cruel dia,

Esse dia fatal, que tu seguiste,

Noite de espanto, noite de agonia.

Tejo, que foste da Tragédia triste

O Teatro infeliz, que é do Tesoiro,

Que a meus olhos saudosos encobriste?

Ah! Não blasones das areias de oiro,

Se em ti conténs o Herói, que ao próprio Marte

Esperava ganhar a palma, o loiro.

José, que, reunindo a força, e a Arte,

Feros Brutos indómitos domava,

Sendo assombro de tudo em toda a parte;

José, que os lusos Povos alegrava,

E que, sem recordar-se da grandeza,

A todos brandamente agasalhava;

José, com quem a sorte, e a natureza

Foram tão liberais, e em quem luzia

Resto feliz da gloria Portuguesa.

Oh lúgubre Destino! Oh Morte ímpia!

Ilustre, e velho Pai! Tua amargura

Quão rigorosa, quão cruel seria!

A macilenta Cloto, a Parca dura

Te roubou para sempre o Filho amado,

O doce objeto da maior ternura.

Queixa-te, é justo, queixa-te do Fado,

O negro caso deplorável chora,

Em nossas faces pela Dor gravado;

Pragueja aquele Monstro, que devora

Os míseros mortais, dize-lhe… ah! antes,

Antes a suma Providência adora.

Adora a quem nos Astros cintilantes

Erígio, colocou seu Trono eterno,

O supremo Senhor dos Céus brilhantes,

O Justo Deus, que com poder superno

Escondeu, ferrolhou perpetuamente

Os rebeldes espíritos no Inferno.

Ele, movendo o braço Omnipotente,

O filho te chamou, que merecia

Gloria imortal no Empíreo reluzente.

Basta, excelso Marquês. Tua agonia

Pela Fé seja em fim modificada,

E por uma Cristã Filosofia.

Que também na minha alma atribulada

Oiço o rizo da cândida Esperança,

Sinto a terrível Dor mais aplacada.

E tu, Alma gentil, que na lembrança

Tão presente me estás, Alma ditosa,

Entre os Coros Angélicos descansa.

Não precisa de lágrimas quem goza

De eterna, de imortal Felicidade,

Por isso é nossa dor infrutuosa;

Porém, com tudo, lá da Eternidade,

Do centro da Ventura mais perfeita,

Se te é possível, feliz Alma, aceita

Provas de Amor, efeitos da saudade.

SONETO.

Tudo acaba. Esse Monstro carrancudo,

Prole do Averno, efeito do Pecado,

Tudo a cinza reduz, brandindo, irado,

Com sanguinosas mãos o ferro agudo.

Oh fatal Desengano, horrendo, e mudo,

Em pavorosos mármores gravado!

Oh letreiros da Morte! Oh lei do Fado!

He verdade, é verdade: acaba tudo.

Eis o nosso misérrimo Destino:

Assim o ordena quem nos Céus impera;

Basta, adoremos o Poder Divino.

Reprime os passos, caminhante, espera,

E no Epitáfio do infeliz Josino

Lê o teu nada, o que tu és pondera.