Por Leila Marangon
setembro/2025
Carlo Levi nasceu em Turim, em 1902, e faleceu em Roma, em 1975. É reconhecido como um dos grandes intelectuais italianos do século XX. Foi escritor, médico, pintor, jornalista, ativista político e senador da República Italiana. Era sobrinho de Claudio Treves, figura proeminente do Partido Socialista Italiano, e seu convívio no ambiente politizado de Turim foi decisivo para que Levi se tornasse militante antifascista e fosse preso algumas vezes: por um curto período em 1934, em 1935 (quando foi condenado ao confinamento no sul da Itália) e novamente em 1943.
Carlo Levi relata, em seu primeiro livro publicado, Cristo si è fermato a Eboli (em português “Cristo parou em Éboli”), a experiência do cumprimento da pena de confinamento que lhe foi imposta pelo regime fascista de Mussolini, entre os anos de 1935 e 1936, nas cidades de Grassano e Aliano, ambas na província de Matera, na região da Basilicata (que, na época, chamava-se Lucânia). A condenação previa pena de três anos, mas, para celebrar a vitória italiana na guerra da Abissínia (atual Etiópia), o governo concedeu indulto a condenados e Carlo Levi foi liberado antes de cumprir um ano da pena.
Os meses em que viveu na província de Matera propiciaram a Carlo Levi o conhecimento da realidade de uma região paupérrima e abandonada pelos poderes constituídos do Estado, bem como pela Itália mais desenvolvida do norte; propiciaram-lhe, ainda, a interação direta e de certa forma afetuosa com a população local. Embora Levi não exercesse a medicina, sua condição de médico facilitou sua aproximação com os habitantes do lugar.
Cristo parou em Éboli revelou à Itália desenvolvida do norte a realidade de uma região totalmente ignorada até então, habitada por pessoas simples, com hábitos e crenças arcaicas, que viviam em condições de extrema miséria, abandonadas à própria sorte. A linguagem utilizada no relato é bem cuidada, repleta de expressões populares e dialetais, provérbios, ironias, metáforas e outras figuras de linguagem.
No livro, Carlo Levi chegou a alterar para "Gagliano" a grafia do nome da cidadezinha de Aliano, na Lucânia, onde ficou confinado (depois que saiu de Grassano, na mesma região), pois era assim que a população local se referia a ela.
Observa-se que o uso da linguagem local na fala dos personagens deve-se a "um dever e uma necessidade" de se retratar fielmente a realidade, comum aos escritores do período, chamado de neorrealismo italiano, do qual o livro é importante representante. O neorrealismo italiano foi um movimento cultural surgido no final dos anos trinta do século passado (e cujo ápice ocorreu em meados dos anos quarenta), em decorrência do anseio dos intelectuais da época de embasar suas manifestações artísticas nas emoções mais genuínas e populares da sociedade, integrando arte e realidade.
Cristo parou em Éboli é o primeiro romance e livro mais conhecido de Carlo Levi. Foi escrito em Florença entre dezembro de 1943 e julho de 1944 e publicado pela Editora Einaudi, de Turim, em 1945.
O livro tem características que impossibilitam seu enquadramento em um único gênero literário, uma vez que possui conteúdo memorialístico (foi escrito nove anos depois dos fatos nele narrados), documentário, sociológico, ensaístico, romanesco, de denúncia política e de literatura de viagem.
O título do livro refere-se a uma expressão utilizada pelos habitantes da Lucânia para demonstrar a dimensão do abandono em que viviam: Cristo teria parado em Éboli, cidade da província de Salerno, na região da Campânia, onde terminava o acesso por trem, que não chegava a alguns dos locais mais miseráveis do extremo sul da Itália.
A obra teve excelente recepção na Itália e no Brasil. Durante os anos trinta, quarenta e meados dos anos cinquenta, Carlo Levi era bastante citado na imprensa, tanto italiana como brasileira, não só pelo seu livro, mas também por sua atividade de pintor e sua militância política. A partir do final da década de cinquenta, as citações começaram a rarear. O mesmo não aconteceu com as traduções brasileiras que foram pouco citadas na imprensa nacional.
O livro tem três traduções no Brasil: a primeira foi feita por Nair Lacerda e publicada em 1952 pela Editora Mérito, do Rio de Janeiro, com o título de "Cristo ficou em Éboli"; a segunda, realizada por Wilma Freitas Ronald de Carvalho intitulada "Cristo parou em Eboli”, publicada pela Editora Nova Fronteira, também do Rio de Janeiro, em 1986; a terceira tradução, também com o título “Cristo parou em Éboli” foi feita por Roberto Fasano Neto e publicada em 2018 pela A4 Ideias e Terceira Margem.
Além de Cristo si è fermato a Eboli, apenas La doppia notte dei tigli tem tradução brasileira, de Liliana Laganá, para a Editora Berlendis & Vertecchia, em 2001, com o título de “A dupla noite das tílias”.
A produção literária de Carlo Levi é composta de ensaios, romances e relatos de viagens.
Em 1961, Carlo Levi executou a monumental obra “Lucania`61”, um painel medindo 18,5 x 3,20 metros, pintado para representar a região da Basilicata na mostra Itália 61, realizada em Turim para celebrar o primeiro centenário da unificação da Itália. A obra encontra-se no Centro Carlo Levi, em Matera, na Basilicata.
Em 1979, o cineasta Francesco Rosi realizou a adaptação de “Cristo parou em Éboli” para o cinema. O protagonista do livro é o próprio escritor Carlo Levi que, no filme, foi interpretado pelo ator Gian Maria Volontè.
A vivência no sul da Itália transformou a vida de Carlo Levi e da região que, com a visibilidade decorrente da publicação e do grande sucesso alcançado pelo livro, atraiu a atenção pública para as miseráveis condições de vida da população da região meridional (como é conhecido o sul da Itália). Durante seus mandatos como senador, Carlo Levi ocupou-se de projetos que visavam a inclusão das regiões do sul nas políticas governamentais de desenvolvimento social.
Carlo Levi faleceu em 04 de janeiro de 1975 em Roma e está sepultado em Aliano, cidade na qual havia cumprido a maior parte da pena de confinamento quarenta anos antes.
LEVI, Carlo. Cristo si è fermato a Eboli: 1ª edição. Torino: Einaudi, 1945.
LEVI, Carlo. Cristo ficou em Eboli. Tradução de Nair Lacerda. 1ª. edição. Rio de Janeiro: Mérito, 1952.
LEVI, Carlo. Cristo parou em Eboli.Tradução de Wilma F. Ronald de Carvalho. 1ª edição. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
LEVI, Carlo. Cristo parou em Éboli.Tradução de Dr. Roberto Fasano Neto.1ª edição. São Paulo: A4 Ideias e Terceira Margem, 2018.
LEVI, Carlo. Cristo parou em Eboli. Tradução de Wilma Freitas Ronald de Carvalho. 1. ed. Rio de Janeiro, RJ: Editora Nova Fronteira, 1986.